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Inter Mirifica

Carlos Frederico Gurgel Calvet da Silveira Presidente do Centro Dom Vital Entre as coisas admiráveis (inter mirífica) de nossa época, estão “aqueles meios que não só por sua natureza são capazes de atingir e movimentar os indivíduos, mas as próprias multidões e a sociedade humana inteira, como a imprensa, o cinema, o rádio, a televisão e outros deste gênero, que por isto mesmo podem ser chamados com razão de Instrumentos de Comunicação Social” (Decreto do Vaticano II). O Vicariato de Comunicação Social e a Assessoria de Imprensa da Arquidiocese do Rio de Janeiro confirmam as palavras do documento conciliar. Os meios de comunicação, e também as forças políticas, foram capazes de movimentar se não multidões em número (pois muitos católicos apoiaram a primeira decisão da Arquidiocese), ao menos o “espírito de multidão”. Com efeito, parece que, com este espírito, os órgãos arquidiocesanos, sensíveis ao jornalismo e ao mundo artístico carioca, reverteram o parecer da nossa querida Arquidiocese sobre o veto ao uso da estátua do Cristo Redentor do Corcovado, na cena do filme em que um ator termina suas lamúrias ao símbolo religioso mais famoso do Rio com um gesto obsceno (uma “banana”, conforme o declarado no Globo há cerca de duas semanas). Dizia ontem a respeito do artigo de Bellotto: “diurnarius diurnarium fricat”. Que dizer dos achincalhes, da falsa doutrina, do deboche, do vilipêndio contra os católicos que pulularam no Globo com as matérias de Cora Rónai, Arnaldo Bloch, Frei Betto, Tony Bellotto, além dos próprios envolvidos no filme? Esperamos que a Comissão de Doutrina da Fé da Arquidiocese reafirme as belas mensagens da fé cristã que foram “vilipendiadas” nesses artigos. Os Evangélicos, que não têm imagens em seus templos, hão de estar ofendidos e admirados (“mirífici”) com a decisão do Vicariato e da Assessoria de Imprensa da Arquidiocese. Eles nunca imaginariam que católicos pudessem recuar assim no tema em pauta, especialmente porque estes, com certa razão, e num passado recente, clamaram contra um pastor que chutara a imagem da Virgem, a Mãe do Redentor. Lamento por ter participado com a Arquidiocese, da propaganda do filme em pauta, ainda que involuntariamente. Lamento ademais por ser um filme de José Padilha, que ainda não disse a que veio no cinema nacional, ou melhor, disse, na ordem da movimentação de verba, mas seus filmes não trazem grande interesse à vida do espírito. Contudo, guardarei na memória, do Globo de hoje, a mais consequente proposta defendida por Padilha em resposta à generosidade da nossa Arquidiocese: “­Não há espaço para a censura religiosa em países civilizados, que respeitem a liberdade de expressão e a crítica aberta de ideias. Resta saber se a sociedade carioca e a prefeitura vão agir para formalizar juridicamente a ideia de que o direito sobre a imagem do Cristo pertença a todos, como deve ser o caso para monumentos desse tipo”.

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Nihil Novum sub sole: “Cristo não é o Cristo” segundo Tony Bellotto

Carlos Frederico Gurgel Calvet da Silveira Presidente do Centro Dom Vital Diurnarius diurnarium fricat. Permitam-me começar com dois provérbios em Latim. Espero que o que inicia este parágrafo se clarifique até o final desta matéria; o que lhe dá título é bem conhecido de todos: nada novo sob o Sol. Com efeito, a matéria de Tony Bellotto no Globo de hoje está nesta precária situação. Contudo, parece que o grande jornal carioca vê as coisas de modo diferente: que ainda consegue tirar leite de pedra. Pelas minhas contas, a matéria de hoje sobre o Cristo Redentor do Corcovado é a sexta, em duas semanas, escrita por quem desconhece a doutrina cristã e pontifica não somente sobre a liberdade de expressão e de criação, mas também sobre o conteúdo da fé. O título da matéria de Bellotto é de tal obviedade que não se sabe mais qual é o Cristo que não é o Cristo: é o Redentor do Corcovado que não é o Cristo bíblico (sic!) ou, o Cristo bíblico que não é o Cristo Redentor do Corcovado? O pior é que qualquer resposta vale, pois todos já notaram que o título não tem sentido. Simplesmente porque é pretensioso, não tem estilo. Está mal escrito. Indico aqui algumas expressões que são o “leite fresco” de Bellotto. 1) “O veto é um atentado à Liberdade”, com maiúscula, aquela liberdade com “L” proclamada por Arnaldo Bloch; 2) “Nada mais anticarioca do que a falta de humor”, parece que tirou isto da boca dos turistas que visitaram o Rio nas últimas semanas ou, ao menos, das reportagens que se reproduziram exaustivamente na mídia; 3) “… desinteligência e intolerância dos clérigos responsáveis por esse veto”, uma elegância desnecessária de Bellotto, mas que se completa abaixo, ao refletir sobre a formação do clero: 4) “de que adiantaram todos aqueles anos no seminário…?”; 5) “Um Estado laico não pode permitir que uma religião detenha os direitos de um monumento público tão importante…”, refere-se a um Estado de Direito? Sim, é a democracia que defende a liberdade de expressão e a liberdade religiosa, que inclui a proteção do culto e de seus símbolos, acidentalmente ligados no caso ao direito de imagem sobre a estátua do Cristo, ou Bellotto está propondo a supressão de algum direito? 6) “… O Cristo Redentor não é o Jesus Cristo da Bíblia”, de novo o mesmo problema, pois ou o autor se refere ao Cristo Redentor do Corcovado ou está fazendo nova teologia ao dizer que o Cristo do Evangelho não é o Redentor; a citação que se segue é um pouco mais longa, serve para percebermos o sentido poético de nosso autor, de tendência barroca, aliás: 7) “O Cristo bíblico é uma figura geralmente representada pela imagem de um homem agonizante pregado a uma cruz, com chagas, feridas sangrentas e outras marcas de tortura espalhadas pelo corpo descarnado, cuja face encovada e olhos cerrados sombreados por uma coroa de espinhos indicam uma assustadora iminência do rigor mortis, a rigidez do corpo que ocorre horas após a morte. As imagens do Cristo crucificado impressionam pela violência e morbidez.” Ora, a pessoa do Redentor não é exatamente o Cristo Ressuscitado do Evangelho? E esta verdade evangélica não foi a Igreja que a transmitiu por dois mil anos e que foi a base espiritual dos valores brasileiros e para a estátua que domina a Cidade do Rio? A novidade do Cristianismo é justamente o Cristo Ressuscitado, que morreu, sim, mas venceu a morte por todos nós. Há muitas passagens infelizes no artigo “Cristo não é o Cristo”. Contudo, em homenagem ao nome do autor, fico com oito belas citações; a última aparece em destaque no próprio Jornal: 8) “O Cristo carioca personifica um homem ereto, simpático, plácido e saudável, em cujo rosto se pode perceber um sorriso sutil.” Parece poesia. A segunda metade do artigo (esta era a primeira metade!) é ainda mais pueril. O autor continua a trazer novidades: a simpatia do carioca, as mazelas do Rio, o Cristo de braços abertos, citações bíblicas raivosas, a parte mais famosa da história da construção do Cristo do Corcovado, o Cristo Redentor de todos etc. Bertrand Russell, um dos mais prolíficos escritores ingleses do século XX, que escreveu obras de peso na área da Lógica, perdeu-se em escritos de segunda categoria, às vezes, obras manuais e panfletárias. E é de um panfleto que Bellotto toma a citação do pensador inglês para o fechamento de seu artigo. Prêmio Nobel, Russell era ateu e não fez juízo isento a respeito do Cristianismo. Contudo, suas ideias servem de chave para interpretação geral do texto de Bellotto: a crítica infundada ao Cristianismo em nome dos Direitos humanos perpetrada pelo inglês, e por companheiros como Sartre, constituía-se num ativismo anticristão que, passadas as décadas pode ser entendida como uma busca de supressão da liberdade religiosa. Bellotto repete o que ouviu aqui e acolá. Diante de todas as vozes que ouvimos nestas últimas semanas, proponho esta paráfrase a partir de outro provérbio latino: Diurnarius diurnarium fricat: um jornalista afaga outro (A propósito, “diurnarius”, jornalista, é termo novo, da atualização do vocabulário latino para a nossa época, conforme o Lexicon Recentis Latinitatis, Vaticano, 2004). Bellotto parece não encontrar nada novo sobre o assunto desde Bertrand Russell e do que escreveram seus colegas do Globo recentemente. Até a Igreja Católica a que se refere pertence à época que seus avós, que, conhecedores da Bíblia e do Latim, diziam: “Nada novo sob o sol”. Ora, os grandes pensadores em atividade no mundo de hoje estão conscientes de que a luta pelos direitos inclui a luta pela liberdade religiosa. Recomendo, de modo especial, as obras do filósofo canadense Charles Taylor, que esteve no Brasil, no ano passado, para discutir temas relativos ao processo de secularização das nossas sociedades. É neste patamar do Direito que se deve situar o debate. O Estado laico numa sociedade democrática não somente respeita, mas preserva as tradições e as diferenças religiosas da nação. O leitor una seus sofrimentos às

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Salmo Amigo: Frei Betto, a nova voz do Coro

Carlos Frederico Gurgel Calvet da Silveira Presidente do Centro Dom Vital O Globo de hoje já não nos surpreende, passadas duas semanas de matérias que versam sobre tudo e qualquer coisa, incluindo doutrinas teológicas imprecisas e incorretas, para opinar contra o parecer da Arquidiocese sobre o filme “Inútil Paisagem”, chegou a vez da “exegese” ou da teologia de Frei Betto. Trata-se duma hermenêutica que usa os salmos fora de contexto. Vale a pena lembrar que o filósofo holandês, Baruch de Spinoza, no século XVII, escreveu uma das obras mais críticas à Sagrada Escritura, o Tratado Teológico-Político, onde defendia a necessidade de ler a Escritura no seu contexto. De lá para cá, não há grandes exegetas, nem os exegetas cristãos nem judeus, que neguem este princípio estabelecido no capítulo VII da obra citada. É verdade que outros mestres da Escritura, de um modo ou de outro, defenderam algo análogo, como o judeu Maimônides, na Guia dos Perplexos, e o próprio Tomás de Aquino na Suma Teológica. Assim, Maimônides negou a leitura antropomórfica da Escritura e o próprio Tomás seguiu esse caminho. Fora de contexto, foi outra história narrada pelo dominicano Frei Betto acerca de seu encontro com o papa Francisco na Praça de São Pedro. Algo absolutamente casual numa audiência geral que o brasileiro valoriza como se fosse uma audiência privada. Segundo o frade brasileiro, o papa teria ouvido seu clamor de absolver outros dominicanos, entre eles, Giordano Bruno, do século XVI, condenado à época. O suposto diálogo, que se inicia com os conselhos do frade ao papa Francisco, aparece relatado pelo próprio Frei Betto no Globo do dia 10 de abril passado: — Como pai amoroso, dialogue sempre com a Teologia da Libertação, que é uma filha fiel à Igreja. E tenha sempre presente a defesa dos povos indígenas. Assediado por tanta gente que o rodeava, o Papa continuou atento. Completei: — Como frade dominicano, ponho em suas mãos a reabilitação de Giordano Bruno e Mestre Eckhart. …………………………………………………………………………………… Francisco reagiu à minha solicitação: — Ore por isso. Ao final, me dirigi a ele, primeiro em latim, e logo traduzi para o espanhol: — Extra pauperes nulla salus. Fora dos pobres não há salvação. Francisco sorriu: — Estou de acordo — disse ao se afastar. O artigo de Frei Betto pode ser lido em sua íntegra e contexto neste endereço: http://oglobo.globo.com/sociedade/encontro-com-francisco-12147699. O porta-voz da Santa Sé, Frederico Lombardi, apressou-se em esclarecer a informação fora do contexto exato: Ao contrário do publicado ontem, 10 de abril, por alguns meios de comunicação, não houve audiência em Santa Marta do Papa Francisco com Frei Betto mas, como de costume, no final da audiência de quarta-feira com os fiéis, apenas um breve encontro no adro da Praça de São Pedro, durante o qual o Pontífice se limitou a escutá-lo e saudá-lo. No Globo de hoje, Frei Betto reincide em apresentar ideias ou fatos fora de contexto. Desta vez, sua descontextualização está a serviço da defesa do uso da imagem do Cristo Redentor no filme de José Padilha, contra o parecer da Arquidiocese do Rio. Chega a citar em defesa de suas opiniões o papa Bento XVI!, de quem fora crítico pertinaz e a quem chamara de “cabo eleitoral de forças conservadoras”. O mais grave, contudo, é a descontextualização dos Salmos, oração milenar cotidiana da tradição litúrgica judaica e cristã. Referindo-se a um gênero de salmo de lamento, atribui à cena polêmica do filme citado, a mesma atitude orante do salmista. É verdade, que os salmos também são por vezes orações de revolta e, por isso mesmo, de consolo. Contudo, o lamento, neste caso, insere-se em contexto orante. Trata-se duma oração de bênção, uma “berakhah”, como se diz em hebraico. Podemos abençoar até nossas revoltas, nossas dores, nossos pecados. O mesmo que fez Bento XVI em Auschwitz, ao adaptar a passagem do Salmo 22, 2, citada por Jesus, conforme o Evangelho de Marcos (15, 34): “Por que, Senhor, permaneceste em silêncio?”. Tudo isto está no contexto da oração. Ou melhor, a vida é transformada em oração, é consagrada a Deus, a cada momento, a cada atividade. Visa-se a uma consagração integral e, por isso mesmo, o salmo inclui esses momentos de crise que fazem parte do cotidiano de cada um de nós. Não parece que seja este o contexto do filme. Há, entretanto, uma boa notícia no artigo de Frei Betto, chamado de “O Salmo de Wagner Moura”. Fica-se sabendo, com alegria, que o ator e outras personalidades do meio artístico e jornalístico participam de encontros de oração e meditação em companhia de Frei Betto. Infelizmente, porém, muitos artistas e jornalistas têm, nestas duas semanas, criticado erroneamente a atitude da Arquidiocese, com acusações preconceituosas e incorretas com a fé cristã, como foi o caso de Arnaldo Bloch e de Cora Rónai, na semana passada, além dos próprios envolvidos no filme. Frei Betto faz-lhes coro. A esta altura, não sabemos mais se o artigo de Frei Betto é “fogo amigo”. Betto confessa-se homem de Igreja, mas não é da oração dos salmos cantados no coro dos dominicanos há oito séculos de que Frei Betto participa, mas do coro dos que têm voz na mídia, do coro das frases e ideias que agradam e fazem sucesso, dos clichês, numa mídia que cotidianamente denigre a Igreja. Somente O Globo já publicou, em duas semanas, quatro ou cinco matérias integrais contra a Arquidiocese! Não há artigos em sua defesa, a não ser pequenas participações, em parte dessas matérias, de um ou outro teólogo. É um coro de massificação, que já ouvimos tantas vezes, ao qual tenta se afinar Frei Betto, sem sequer nos fazer lembrar das melodias de seu Convento.

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Um “no momento” perturbador

Robson de Oliveira Silva Membro do Centro Dom Vital A literatura registra alguns exemplos de locuções adverbiais perturbadoras. Na escatologia de C. S. Lewis, “A última batalha”, com pragmatismo político digno de um Richard Rorty, Ruivo e o Rishda Tarcaã combinam a utilidade temporária de Manhoso. Assim “no momento” em que as circunstâncias mudarem, o macaco será o primeiro a ser sacrificado. Em “Rei Lear”, o ardiloso Edmundo revela a decisão de manter-se unido à Regan e Goneril “por enquanto (now then)”. A locução adverbial traça o perfil psicológico do personagem de Shakespeare, que usa as filhas do rei enquanto são úteis a seus interesses. Quando as circunstâncias mudarem, igualmente mudarão os sentimentos relativos às princesas. A tragédia grega de Eurípedes também nos ensina algo: até o leãozinho é grato pela generosa mão que o alimenta, mas apenas “no momento” do benefício. Quando crescer, o filhote de leão agirá como lhe ordena a natureza. Assim, a locução adverbial serve como alerta para os leitores: as coisas em breve podem mudar. A referência diz respeito à Clitemnestra, esposa dedicada, que não tardará em trazer infortúnio ao rei Agamenon e sua concubina. O texto “O veto do Cristo é golpe de estado”, de 12/07 em O Globo, não merece atenção pela sua salada acusatória. A despeito da megalomania do cronista, que quer transformar o cumprimento de um inciso da Constituição Federal em uma crise republicana, o texto não é diferente de outras peças jornalísticas dos periódicos nacionais que são, há algum tempo, míopes, simplistas e – nesse caso particular – clichês históricos sobre religião, demonstrando quanto de paixão e subjetividade está tomado seu autor. Termos como “Santo Ofício”, “Bula” e “Absolutismo” só testemunham seu envolvimento visceral, minando a imparcialidade necessária à empresa jornalística. Outro ponto, porém, prendeu minha atenção. Em certa parte do discurso, o texto diz que o direito pelo uso da imagem do Cristo Redentor é da Igreja Católica “no momento”. Confesso que a construção da frase inquietou-me. O que quereria dizer com ela seu autor? Será que pretendia propor que o Estado limitasse a ação civil da Igreja Católica? Será que ele acha saudável para um estado democrático que haja limites na ação civil das confissões religiosas? Ou que o direito das confissões religiosas de constituírem-se sujeitos sociais e de omitirem opiniões é um benefício concedido por generosidade e que pode ser retirado à sua revelia? Bem, não sei o que ele quis dizer, mas sei o que ele disse. No texto ele diz que quando a Igreja escolhe tomar decisões como essas, isto é, quando não cede a pressões da opinião pública, ela põe em risco a democracia e que, portanto, a democracia (que nesse caso se confunde com a opinião do articulista) deveria impor sua vontade sobre a Igreja, limitando – não se sabe como! – seus direitos sobre o Cristo Redentor. Para essa batalha o artigo convoca a OAB, o Ministério Público, “o Judiciário como um todo” e todos os homens que se submetem à sua opinião. A questão é: por que parar por aí? Por que não impor limites também, sei lá, aos jornais paroquiais de todo o Rio de Janeiro que ,”no momento”, desafiam a democracia (claro, só os jornais daqueles padres que não se alinham ao juízo do articulista)? Afinal, eles também poderiam pôr em risco a democracia. E há também o jornal da Arquidiocese. E as rádios paroquiais. E a Rádio Catedral. Levando a sério a locução adverbial do articulista, é só uma questão de tempo até a sociedade civil impor limites às pretensões desses religiosos autoritários, que cometem o crime de dar opinião na vida pública. Entretanto, parece que o zelo por defender o Rio e o Brasil do autoritarismo só se levanta quando a acusada é a Igreja Católica. Pois veja: em maio de 2014, quando o parlamentar Jorge Bittar defendeu abertamente o marco civil para as comunicações, o articulista não proferiu palavra em seu espaço no jornal; também em maio, quando o encontro de blogueiros, organizado pelo partido da situação, defendeu escancaradamente o controle da imprensa como meta governamental, novamente o silêncio tomou conta do articulista. Os arquivos do jornal estão lá para demonstrar que o articulista não emitiu qualquer rusga de crítica à tentativa do governo da situação de impor limites à imprensa. Ele não vê nessas atitudes risco de golpe institucional contra a República, mas acredita que a permissão ou recusa de uso de uma imagem em um filme atenta contra a democracia. Sou só eu ou temos aqui o que se pode chamar de zelo democrático “dirigido”? Na perspectiva de muitos cidadãos fluminenses, o episódio não trata de censura. O leitor não se deixe enganar: não se trata de proibir a exibição de um filme. Nem de liberdade de expressão cultural. Não se trata do uso de uma imagem protegida por lei, nem de propaganda gratuita de um produto. Trata-se de algo muito maior! Algo que o autor não conhece e que, infelizmente, não parece respeitar. Trata-se do sentimento religioso de milhões de pessoas, pessoas que pagam seus impostos, pessoas que não querem ver o símbolo de sua fé servindo de achincalhe para um grupo de artistas. Essas pessoas têm ou não o direito de proteger sua fé e os símbolos que lhes são caros?  

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Jornalismo Niilista: Os Abantesmas Teológicos de Arnaldo Bloch

Carlos Frederico Gurgel Calvet da Silveira Presidente do Centro Dom Vital   Retrocedemos. De terça-feira a hoje, retrocedemos. No Globo de hoje, sábado, Arnaldo Bloch em sua coluna assusta-se com fantasmas, abantesmas teológicos: Animismo, Obscurantismo, Sadismo, Fundamentalismo, Golpismo poderiam ser os seus nomes. São, contudo, figuras conhecidas da crítica superficial e de propaganda enganosa, sobretudo contra a religião. Mas, repito: retrogradamos, para nos mantermos no campo semântico acusatório da Cora Rónai de terça-feira. Se esta jornalista praticava naquela ocasião um ‘jornalismo negativo’, Arnaldo Bloch degrada-se ao niilismo. E isto basicamente porque, em seu enfadonho artigo, de título alucinatório, “Veto do Cristo é Golpe de Estado”, o autor solapa seus próprios princípios. Defende o direito de liberdade de expressão, solapando o Direito e a Justiça. O Direito que garante a liberdade de expressão garante também os direitos da Arquidiocese sobre a imagem do Cristo Redentor. Esta é a questão em pauta. Uma coisa é questionar o direito da Arquidiocese sobre a estátua, como insinua o próprio autor: “O direito, no momento, concedido à Igreja Católica sobre a estátua…” (grifo nosso). Outra é contestar o direito de preservação do culto e do que a ele se relaciona, que repudia “ultraje a ato ou objeto de culto religioso”(Art. 208 do código penal). A confusão entre estes dois níveis do direito, por se ter repetido durante a semana toda, parece então proposital. Até mesmo o presidente da Comissão de Direitos Autorais da OAB do Rio, Dr. Fábio Cesnik, que discorda do parecer da Arquidiocese, faz esta distinção em outra página da mesma edição de hoje do Globo. Mas não é só isso. Há expressões claramente preconceituosas no texto de Bloch: “cruzada censória”, “bula”, “bulas medievais” (o adjetivo não podia faltar!) “fundamentalismo”, “narrativas milagreiras”. São expressões anacrônicas do imaginário de pessoas semicultas que, por isso mesmo, surtem os efeitos esperados pelo jornalismo niilista. Niilismo, entre outras coisas, é a negação da fundamentação da realidade. Por que, todos os dias, temos de ler no Globo e em outros jornais de grande circulação, os melhores do país, essa enxurrada de asneiras, de ignorância temática? O niilismo anulou o próprio jornalismo? Também os leitores informados devem estar cansados dessa propaganda. Vamos aos “conhecimentos teológicos” de Bloch: “…uma vez que o catolicismo, que tem no animismo seu maior poder, (…) trabalha suas imagens de pedra, gesso, madeira, ouro, como se estivessem carregadas da substância divina”. Que é animismo? É aquela crença que defende que todos os seres, os corpos inclusive, têm vida, alma, enfim, são animados. Pode pertencer também a uma corrente filosófica, por exemplo, quando uma filosofia defende que o mundo é vivo, no sentido em que há uma “alma do mundo”. Ora, nada mais impróprio em relação ao Cristianismo. Para o Cristianismo, só têm animação os viventes, a saber, os vegetais, os animais e o homem, sendo que este último é animado pelo espírito. Símbolos simbolizam, não há animismo nisto! Se a lei protege de ultraje os símbolos nacionais (bandeira, hino etc.), por que não protegeria símbolos religiosos? Estado laico não significa Estado indiferente à proteção das crenças e valores de seus cidadãos. Ofensas morais à representação de uma pessoa ou de uma instituição, não são ofensas morais a esta pessoa ou instituição? Xingar a fotografia de alguém, dirigindo-se à pessoa representada, não constitui xingamento? Escapa a Arnaldo Bloch a mais ululante tautologia: a representação representa algo. A doutrina cristã, especialmente a Igreja Católica, também é contrária a qualquer fundamentalismo religioso porque, no fundo, é o fundamentalismo uma variante da descrença. A fé cristã procura mostrar seus argumentos racionais até onde isso é possível. No caso em pauta, não há dificuldade de ver que o direito de preservação da imagem de uma estátua, que não é viva, fundamenta-se na racionalidade do Direito que garante a liberdade religiosa que, para tal, preserva os símbolos e objetos de culto das religiões. É fácil reconhecer que o Cristo Redentor é também um símbolo nacional, então o desafio seria como conjugar um direito já assegurado constitucionalmente com os direitos de uso da imagem por quem não crê ou que, além de crer, queira usá-la em outras funções que não a de expressão de fé. Este é um verdadeiro desafio que o jornalista poderia abordar em sua matéria, pondo, assim, o problema no patamar dos argumentos e não da mera propaganda. Parece que o texto da cena que foi revelado pelos produtores não é integral, contudo o que lemos não é facilmente aceitável. E não se trata somente de palavras, mas também de gestos, pois parece que a personagem na polêmica cena despede-se com um gesto obsceno à imagem do Cristo Redentor. Enfim, a ausência de fundamentos e de argumentos numa questão de direitos não pode ser defendida por ninguém em nome da liberdade, menos ainda por Bloch, que é escritor, muito embora a acusação de hibridismo que ele atribui à Igreja Católica esteja presente em seu próprio artigo, tornando-o ambíguo e sem fundamento do começo ao fim. Quando trata da “Liberdade com “L” maiúsculo”, ninguém pode saber ao certo o que é isso. Sobra propaganda, faltam argumentos.

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O ‘Jornalismo Negativo’ de Cora Rónai

Carlos Frederico Gurgel Calvet da Silveira Presidente do Centro Dom Vital Filósofos e teólogos neoplatônicos distinguiam, há quase dois milênios, quanto ao conhecimento de Deus, uma via negativa e uma positiva; chamavam-nas respectivamente via apofática e catafática. A primeira, assumindo a insuficiência de todo e qualquer predicado retirado do mundo para definir Deus, avançaria no seu conhecimento pela negação: Deus não é finito, Deus não é mutável, Deus não é corpóreo. A segunda buscaria, no mundo ou na revelação, aquilo que pode, ainda que limitadamente, manifestar algum aspecto do divino sem, contudo, esgotá-lo: Deus é fonte e essência de todo ser, Deus é amor, Deus é verdade acima de todas as verdades. No Ocidente e no Oriente cristãos, o destino desta distinção filosófica foi decididamente feliz, pois sagrou o reconhecimento de que, em relação a Deus, nosso conhecimento é precário e, portanto, a via negativa seria a mais correta para a teologia, pois preservaria o mistério divino. A via positiva, neste sentido, seria mais bem aplicada a conhecimentos particulares dos quais podemos fazer ciência no sentido mais moderno do termo. Aliás, a ciência em geral é chamada de positiva justamente porque atinge seu objeto com evidência necessária. Do mesmo modo, todo conhecimento de fatos insere-se nesta positividade do conhecimento humano que pode prescindir dos critérios dos atributos negativos, assim também o jornalismo. Nesta manhã, fomos surpreendidos, uma vez mais, por matéria que aparece no Globo. Autoria de Cora Rónai. Na verdade, trata-se de mero parágrafo do artigo que abrange vários temas sob o título apelativo “Dias Horríveis”. Esse curtíssimo parágrafo volta à discussão do início da semana a respeito do parecer da Arquidiocese do Rio sobre um filme de José Padilha. Cora Rónai, que não creio desconheça a legislação brasileira a respeito do tema da liberdade religiosa, que proíbe “ultraje a ato ou objeto de culto religioso” (Art. 208 do código penal),  achincalha a Arquidiocese com os adjetivos “retrógrada” e “obscurantista”, e repito, num parágrafo mínimo, onde não aparecem novos argumentos da jornalista, que, no máximo, se limita a apoiar ideias de terceiros. O problema em questão envolve no mínimo dois direitos dos cristãos, no caso, de modo especial, dos católicos, liderados pela Arquidiocese do Rio de Janeiro: o direito fundamental garantido pela Constituição, que é o respeito às imagens, ao culto de toda e qualquer religião, e este é o direito essencial; e o direito específico, acidental, sobre a imagem do Cristo Redentor, e, por este último, a Arquidiocese foi legitimamente consultada pelos produtores do filme. Portanto, mesmo que a Arquidiocese não tivesse direitos sobre a imagem, o direito constitucional continuaria valendo. Indicar o acidental pelo essencial é sofisma crasso e, por conseguinte, não colabora para o esclarecimento da questão. Além de tudo, o Direito baseia-se na racionalidade. Por conseguinte, quando a Arquidiocese expõe claramente seus argumentos, baseado na ciência positiva do direito e nos fatos, que são igualmente positivos, não há nada de obscuro aqui. Quem parece ter optado por obscurecer os dados foram os produtores, o diretor e um ou outro ator do filme, que em infeliz matéria da terça-feira, na capa do Segundo Caderno do mesmo Jornal, lançaram gritos e acusações infantis, irracionais, porque contra o Direito, sobre o procedimento da instituição católica. Por que a produtora e o diretor José Padilha decidiram não revelar o conteúdo das cenas? Optou-se também aqui pela preservação do mistério. E onde está o jornalismo positivo esclarecedor, que não buscou até agora entender se o conteúdo das cenas fere ou não a fé cristã? Como poderia a Arquidiocese dar seu aval a cenas que “vilipendiam” a fé cristã?  Os argumentos de abalizados autores que apareceram ontem no próprio Globo foram ignorados por Cora Rónai, ou ela não os leu? Trata-se das respostas dos ilustres professores, o Pe. Jesus Hortal, teólogo e jurista, e a Dra. Maria Clara Bingemer, teóloga. Eis o jornalismo negativo que nada acrescenta à informação dos leitores, não traz fato algum, e pretende somente dizer o que não é. Então, onde está o obscurantismo? Onde está o retrocesso? O jornalismo não pode usar o método negativo, que se pode bem aplicar às regiões do mistério com que lida a teologia. O abuso do termo de obscurantismo, especialmente quando dirigido à religião, redundou em evidente banalização. Ironicamente estabeleceu-se sobre o tema uma zona obscura de comunicação. Trata-se, como diz Heidegger, da “incompreensão da trivialidade”. Paulo Rónai, em seu imponente Dicionário Universal de Citações, da Nova Fronteira, cita interessante frase de Jules Janin sobre o jornalismo: “O jornalismo leva a tudo – com a condição de se sair dele”. Sugerimos uma interpretação otimista desta passagem do famoso crítico francês: os bons leitores contam com que os jornalistas dos bons jornais estudem, estudem sempre, para que, ao saírem de seu cotidiano, estes mesmos jornalistas lhes possam oferecer uma reflexão adequada aos fatos que apresentam, quando desejarem julgar os fatos. Em tempo, não se entende por que “Dias horríveis” termina, em contradição com o título, com a informação de que Araquari, em Santa Catarina, “dá exemplo de como se comporta uma comunidade comprometida com a sorte dos animais de rua”: abatimento no IPTU para os que adotarem animais de rua. 10 de julho de 2014

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Associação de leigos católicos, dedicada, desde 1922, à difusão da fé e à evangelização da cultura no Brasil: revista A Ordem, palestras, cursos, etc.