José Arthur Rios
Diretor do Centro Dom Vital
Certa tarde dos anos 50, ia eu pela Praça XV, quando deparei-me com o escritor Gustavo Corção e o dominicano Frei Romeu Dale caminhando, quase correndo rumo a um casarão mal iluminado na esquina da rua Sete de Setembro. “Onde vão vocês com essa pressa?” “Vamos ao centro Dom Vital”. “Pena não poder ir com vocês”. Aí acho que foi Corção quem disse: ” Venha, venha, a porta é estreita mas sempre cabe mais um”.
Não fiquei surdo ao convite. Fui e fiquei longos serões. Eram às terças, na hora sexta. Íamos eu e minha noiva, ouvíamos uma conferência, às vezes simples comunicação, sempre importante. Seguia-se conversa, debate. Abria a sessão a oração de Santo Tomás de Aquino. O capelão rezava a missa.
A presença do capelão marcava a presença da Igreja, os leigos ali reunidos nada pretendiam inovar ou reformar apenas renovar um voto implícito de fidelidade a uma doutrina, ao patrimônio. A oração do Doutor Angélico era farol e fiel na aparente confusão do debate. Podia-se ouvir a ousadia de uma glosa, não aventura de uma contestação. Soma não divisão, muito menos redução mutiladora – pecados dos tempos.
No pensamento de seu fundador, Jackson de Figueiredo – e de seus continuadores – Alceu, Corção, Sobral Pinto o centro nesse tempo era a linha tensa mas nítida entre a doutrina da Igreja e a massa cinzenta do mundo – “mundo, mundo, se eu me chamasse Raimundo” – suspirava, naqueles tempos, Ciro dos Anjos. O mundo fervente de magia e ilusões era ressaca. Batia no cais, nele bem plantada a cruz – a oposição vigilante, o erro, a covardia, a mentira.
Pela tribuna do Centro, naquela sala modesta, depois em recintos mais dignos passaram escritores, poetas, pensadores. Alceu de Amoroso e Lima falava de literatura, Murilo Mendes e Augusto Frederico Schmidt – de poesia; Fernando Carneiro de eutanásia e da cristianização da medicina; Américo Piquet Carneiro – da mentira do materialismo evolucionista. A estreita lauda concedida não permite mencionar tantos outros nem mesmo os estrangeiros, aves de passagem, exilados como George Bernanos que nos traziam as angústias da guerra, a ocupação da Europa, os holocaustos, racismos e colonialismos, – agonia de um mundo velho que desmoronava e os triunfalismos da terra nova que emergia das ruínas. Hoje, outros serão os temas, as angústias são as mesmas.
Era isso o Centro Dom Vital, é o que esperamos que continue a ser na sua missão sempre renovável a serviço da Palavra, modesta lâmpada votiva no altar da Fé.